quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

matinal

os olhos no espelho pra fazer a barba que não existe,
os pêlos ralos,
falhos,
a gilete desliza pelo rosto com ameaças de corte
como se pulsassem as veias,
o sangue querendo jorrar.
enquanto ainda acordava
sonolento procurava algum sentido nas lembranças da última noite, do último dia.
havia alguma certeza ali,
pensava,
enquanto a lâmina arrancava uma penugem mal nascida.
como aborto.
não era nova a sensação
e sentia que estava sempre como que cortando uma barba que não nascera
em movimentos rápidos demais e sem creme ou espuma para aliviar.
sangue.
era o que podia resultar.
passou um papel toalha no rosto molhado
a testa também molhada
(de suor)
percebeu que não havia cortes nem feridas nem nada que não suas espinhas adolescentes
embora não fosse mais jovem e estivesse
cada vez mais
próximo
dos
trinta
e sentisse como se tivesse mais do que isso,
como que velho,
cansado
mesmo que acabando de acordar.
era o ar quente do banho recém-tomado
que formava o vapor e embaçava o espelho e tornava ruim a visão.
era o vapor que deixava tudo tão difuso tudo tão confuso tudo tão
vapor.

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